Pobreza e bem-estar multidimensional em Moçambique
Evidências
- O acesso à educação e a fontes de água segura aumentou rapidamente em Moçambique
- Uma grande parte da população Moçambicana continua privada nos indicadores referentes às condições habitacionais, tais como no acesso ao saneamento seguro, à electricidade e aos bens duráveis, sobretudo nas zonas rurais
- A nível nacional a proporção da população Moçambicana privada em todos os seis indicadores caiu de 47 por cento para 14 por cento entre 1996/97 e 2014/15
- Ainda persistem diferenças muito grandes entre áreas urbanas e rurais, e entre províncias
A pobreza é um fenómeno multidimensional, que envolve outras dimensões para além do consumo, tais como acesso e qualidade da saúde e educação, habitação, posse de bens duráveis, liberdade e muitos outros factores. As abordagens de consumo e multidimensional são complementares: é possível por exemplo que uma família tenha níveis de consumo abaixo da linha da pobreza, mas viva numa casa de boa qualidade, tenha um bom nível de educação, e vice-versa.
Até agora as avaliações da pobreza em Moçambique só apresentaram estimativas e tendências da pobreza de consumo, que são muito voláteis e bastante influenciadas por choques de curto prazo. Pela primeira vez desde 1996/97, ano em que começaram a ser feitas as avaliações da pobreza em Moçambique, a Quarta Avaliação Nacional da Pobreza e Bem-estar em Moçambique 2014/15 apresenta estimativas da pobreza multidimensional e suas tendências ao longo do tempo.
A pobreza multidimensional para os anos 1996/97, 2002/03, 2008/09 e 2014/15 foi avaliada usando seis indicadores a nível de agregado familiar e atribuindo o mesmo peso a todos eles:
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pelo menos um membro concluiu o EP1
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acesso a fontes de água segura
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acesso a saneamento seguro
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cobertura de material convencional
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acesso à electricidade
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posse de bens duráveis de uso comum
A agregação dos indicadores é feita usando o método de Alkire-Foster (A-F), um dos mais usados a nível internacional. Para estimar a pobreza multidimensional, usando o método A-F, é necessário escolher um limite ou cutoff de pobreza, que é a proporção (ponderada) de privação suficiente para identificar um agregado familiar como pobre. Nesta avaliação os agregados familiares privados em pelo menos quatro dos seis indicadores escolhidos foram considerados em situação de pobreza multidimensional.
Melhorias em todos os indicadores de pobreza
Ao nível de indicadores individuais de pobreza multidimensional os resultados mostram uma redução geral do nível de privação ao longo do período 1996/97-2014/15. Contudo, existe uma diferença no ritmo de redução entre os indicadores analisados: o acesso à educação destaca-se entre os indicadores com mais rápida melhoria, seguido do acesso à água potável. Ao mesmo tempo uma grande parte da população Moçambicana continua privada nos indicadores referentes às condições habitacionais, tais como no acesso ao saneamento seguro, à electricidade e aos bens duráveis, sobretudo nas zonas rurais.
Na Figura 1 são apresentados os resultados da incidência da pobreza (H) a nível nacional, urbano/rural e provincial. Observa-se uma grande redução ao longo do tempo, o que sugere que a proporção da população pobre do ponto de vista multidimensional diminuiu substancialmente. No mapa destacam-se os níveis de pobreza nas províncias do centro e do norte do país, muito maiores do que aqueles das províncias do centro-sul.
Figura 1: Incidência da pobreza (H), indivíduos identificados como pobres (%) | ||||
1996/97 | 2002/03 | 2008/09 | 2014/15 | |
País | 0,86 | 0,76 | 0,69 | 0,55 |
Urbano | 0,50 | 0,41 | 0,31 | 0,18 |
Rural | 0,95 | 0,92 | 0,86 | 0,72 |
Outro resultado a destacar está relacionado com o número de privações sofridas: a nível nacional a proporção da população Moçambicana privada em todos os seis indicadores caiu de 47 por cento para 14 por cento entre 1996/97 e 2014/15. Ao mesmo tempo a percentagem de indivíduos não privados, em nenhum indicador subiu desde 2 por cento para 16 por cento.
A melhoria foi particularmente significativa nas áreas urbanas, onde a percentagem de não privados em nenhum indicador subiu para 46 por cento da população urbana. Contudo a proporção de indivíduos privados em todas as dimensões ainda é substancial nas áreas rurais (20 por cento), na zona norte (21 por cento), e na zona centro (16 por cento).
No geral, a pobreza multidimensional diminuiu substancialmente em Moçambique entre 1996/97 e 2014/15, com progressos um pouco mais lentos durante o período de 2002/03 a 2008/09, mas ainda persistem diferenças muito grandes entre áreas urbanas e rurais, e entre províncias. Isto tende a reforçar a conclusão de um crescimento desequilibrado: as cinco províncias do centro-norte (Niassa, Cabo Delgado, Nampula, Zambézia, Tete) são consistentemente mais privadas do ponto de vista multidimensional em todos os inquéritos.
Recomendações de Política
- Políticas de investimento e provisão de serviços públicos focados nas dimensões em que se verificam maiores privações tornam-se cada vez mais imprescindíveis, tanto na perspectiva do bem-estar como na perspectiva da economia política
- Estas políticas e estes serviços são essenciais para atingir um crescimento mais equilibrado
- O fornecimento de serviços sociais e públicos, especialmente aqueles ligados a saúde e educação, é uma prioridade clara
- Em conclusão, alcançar um crescimento inclusivo é o desafio central que Moçambique vai enfrentar no seu desenvolvimento económico e social nas próximas décadas