Opinião

Avaliando a saúde do sector privado em Moçambique: Principais achados da conferência anual do IGM 2022

Desde o ano 2016, o sector privado em Moçambique tem enfrentado vários choques externos, incluindo o terrorismo em Cabo Delgado, os Ciclones Idai e Kenneth, a pandemia de COVID-19,  o conflito ucraniano e seu impacto nos preços das commodities e inflação. Qual é o estado do sector privado moçambicano hoje? Quais são as principais restrições enfrentadas pelas empresas locais, e como elas conseguem lidar com esses choques externos? Estas foram algumas das questões debatidas na conferência anual do programa Crescimento inclusivo em Moçambique (IGM).

A pesquisa apresentada durante a conferência mostra declínio tanto no desempenho das empresas moçambicanas como no ambiente de negócios. Os factores externos têm tido um efeito particularmente devastador nesse sentido.

Existe, contudo, esperança? Na minha óptica, sim.

O Governo de Moçambique tem lançado várias medidas para apoiar o sector privado no curto, médio e longo prazos. Bem implementadas e com recursos necessários, estas medidas podem trazer alguns dos resultados que o país almeja.   

Os desafios enfrentados pelo sector privado em Moçambique

O sector privado joga um papel importante na transformação estrutural da economia moçambicana e no crescimento e desenvolvimento económico do país em geral. Pois, é este sector que faz investimentos nas diversas áreas económicas, gerando emprego e renda para famílias.

Todavia, a pesquisa, incluindo os resultados preliminares do Inquérito às Empresas Manufactureiras Moçambicanas (IIM 2022), indica que emperram também no crescimento do sector empresarial, as barreiras administrativas e as fracas infra-estruturas públicas, que resultam em fracas ligações intersectoriais. Um desafio adicional é o não acesso ao crédito, devido aos condicionalismos impostos pela banca, e a inexistência de fontes alternativas nos sectores estratégicos que exacerba este entrave.

Aliado a isto, o sector empresarial em Moçambique mostra fragilidades em conhecimentos, formação e experiência. Uma das razões por detrás desta fraqueza é – segundo vários dos participantes da conferência – este sector ser ainda emergente. Até há 10 anos, a cultura empresarial no sector formal ainda era embrionária e muitas das empresas locais estão a operar há pouco tempo.

O papel do governo

Conforme referido no painel de discussão da conferência sobre as maneiras para desencadear uma mudança positiva e duradoura no sector privado em Moçambique, o Governo de Moçambique reconhece os desafios do sector privado, e o seu papel em mitigar os efeitos nefastos à economia. Os membros do painel – fazedores de política e representantes do sector privado e academia local – debateram a resposta do governo às inquietações das empresas moçambicanas, representados pela adoção recente das 20 medidas que pretendem melhorar o ambiente de negócios.

Segundo o Dr. João Macaringue do Ministério de Economia e Finanças, este Pacote de Medidas de Aceleração Económica (PAE), tem como objectivo promover investimentos, melhorar o ambiente de negócios e boa governação e fomentar projectos estruturantes de desenvolvimento da economia.

Neste contexto, o Dr. Eduardo Sengo do CTA destacou a importância do diálogo continuo entre os stakeholders para garantir uma boa implementação do PAE.

O painel foi unânime em frisar que as pequenas e micro empresas enfrentam desafios diferentes que às grandes empresas. Será, portanto, necessário adoptar medidas consentâneas as demandas de cada tipo da empresa. Mencionou-se também, a importância de discutir-se os assuntos estratégicos, de forma pragmática e com profundidade, antes da sua implementação. Um exemplo levantado durante o debate é o processo de aquisição (procurement): o Estado sendo o maior comprador no país, como é que podemos criar oportunidades para aumentar a aquisição dos produtos das empresas nacionais?

Quais as perspectivas para o sector privado em Moçambique?

Na minha óptica, um dos momentos mais estimulantes da Conferência Anual do IGM do ano 2022 foi o debate sobre as perspectivas futuras. Segundo os painelistas e participantes, é importante garantir a boa implementação do PAE. É igualmente importante identificar os produtos prioritários para exportação e desenvolver o empresariado local em função destas prioridades, com exigências diferenciadas entre as PMEs e mediante benefícios fiscais.

De acordo com o Prof. Doutor Mussagy da UCM, Moçambique têm grande potencial para o crescimento em agronegócio, manufactura. Mas como é que ela pode aproveitar este potencial? O país tem várias universidades, que podem oferecer cursos técnicos focados no saber-fazer, para dinamizar o sector privado. Entretanto, para que estas instituições possam perceber o que o mercado necessita, há necessidade de estreitar-se as relações com o sector privado local.

Existe, portanto, muitas soluções – e esperança – para o sector privado em Moçambique, só precisamos potenciá-las. Isto inclui corrigir as falhas de mercado existentes, para poder incrementar a produção interna, e alimentar a indústria nacional. Este não é um desafio pequeno, pois para atingir estes objectivos ambiciosos, é preciso a contribuição de todos: o governo, o sector privado, a academia e os nossos parceiros.

 

Josenilde Mário Janguia, é pesquisadora e Professora auxiliar e Chefe de Departamento Académico de Gestão na Faculdade de Economia, Universidade Eduardo Mondlane. Ela é doutorada em Administração Estratégica pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná –Brasil, e Mestrada em Economia, Gestão e Administração.

As opiniões expressas neste blog são do(s) autor(es) e não reflectem necessariamente as opiniões dos parceiros ou doadores do programa IGM.