Research brief

Potenciais benefícios e riscos das indústrias extractivas em Moçambique

Aprendizagens da experiência internacional

EVIDÊNCIAS 

  • As expectativas inflacionadas sobre receitas futuras do sector extractivo levam invariavelmente a decisões políticas imprudentes.
  • A diversificação económica é fundamental. A identificação de políticas para criar, promover e implementar estratégias para as actividades não extractivas é uma componente vital para uma abordagem estratégica mais abrangente às indústrias extractivas.

Moçambique tem testemunhado uma expansão significativa do interesse e investimento nas suas indústrias extractivas. Novas descobertas de gás natural nos últimos dez anos levaram a expectativas de que essas indústrias irão contribuir de maneira muito significativa para o futuro desenvolvimento económico do país e para a sua mudança estrutural a longo prazo

Não conte com os ovos antes da galinha: os perigos das expectativas inflacionadas

Os enormes campos de gás natural do Rovuma, no nordeste de Moçambique, foram descobertos em 2009–11, e os planos específicos para os desenvolver ainda estão em curso. As projecções de 2016 do Fundo Monetário Internacional (FMI) sugerem que a receita total para o Estado proveniente dos projectos de gás, ao longo de seu ciclo de vida até 2045, poderá chegar a cerca de $ 500 biliões de dólares.

Este aumento projectado da extracção de gás ainda não se materializou e parecem agora prováveis pelo menos três anos de atraso em relação aos números previstos pelo FMI. Além disso, em 2016 foram surgindo notícias de grandes empréstimos públicos anteriormente não divulgados que, juntos, são provavelmente equivalentes a cerca de 20% do PIB de Moçambique. Os comentários sobre esta questão ligaram claramente estes grandes empréstimos a uma acumulação de novos empréstimos iniciada em 2013–14, com base no pressuposto de que Moçambique se tornaria rapidamente num exportador global de gás. Os empréstimos comerciais não divulgados violaram as próprias disposições constitucionais do país, os seus limites orçamentais e os seus acordos com os doadores, incluindo com o FMI, que suspendeu o seu programa com o governo em Abril de 2016.

Assim, o anterior quadro fiscal muito promissor foi substituído por uma situação orçamental perigosa e uma dívida pública aparentemente insustentável. A taxa de crescimento de Moçambique diminuiu de mais de 7% em 2015 para 3% em 2016. Com o aumento da inflação e um ambiente de investimento geralmente mais fraco, alguns dos maiores projectos esperados na área dos recursos são, no mínimo, questionáveis.

Tanker © Willian Justen de Vasconcellos / Unsplash
Foto: Willian Justen de Vasconcellos

Política macroeconómica e fiscal: aprendizagens da experiência internacional

As experiências internacionais podem servir como um guia para apoiar a análise agora necessária e para ajudar a identificar e estabelecer o amplo e necessário pacote moçambicano de políticas. Por exemplo, com base nas evidências disponíveis, Moçambique está longe de ser o único país a permitir que projecções excessivamente optimistas incentivem empréstimos e gastos excessivos na antecipação prematura do boom futuro. Este tipo de experiência tem sido observado noutros produtores africanos importantes do sector extractivo, como por exemplo a Nigéria, o Gana e o Chade. O desafio é conseguir que isso não volte a acontecer novamente em Moçambique.

De um modo mais geral, com boas políticas e instituições, um recurso extractivo pode de facto ser um agente de mudança, ajudando a produzir um crescimento acelerado e sustentável. Se forem asseguradas boas políticas e conformidade empresarial, o aumento dos recursos extractivos pode fornecer enormes receitas adicionais para Moçambique, que em parte podem ser usadas para melhorar os serviços de educação e saúde que ainda são inadequados.

Uma outra aprendizagem importante é que o governo deve evitar o erro de pensar de forma estreita em termos das receitas que gere ao taxar as indústrias extractivas. A experiência internacional sugere que os gastos directos e indirectos que não estão sob o controlo do governo podem ser nove ou dez vezes superiores aos dos fundos que o próprio governo controla. Por isso, é importante enquadrar as políticas para garantir o incentivo a que os gastos privados — directos e indirectos, feitos pelos próprios sectores extractivos e pelos seus fornecedores e funcionários — sejam uma força efectiva, que contribui para estimular a produção não extractiva, por exemplo, através de políticas de apoio a novas e melhores actividades das pequenas e médias empresas.

As companhias petrolíferas nacionais (como acontece em Moçambique) são habitualmente uma componente extremamente importante da gestão macro e da gestão fiscal das economias ricas em petróleo e gás. Há exemplos bem- sucedidos dessas empresas noutros países, mas também há vários exemplos de coisas que podem correr mal. São estas as principais aprendizagens para as companhias petrolíferas nacionais, baseadas na experiência internacional: que estas empresas devem ter um papel e um mandato claramente definidos; que não devem ser sujeitas a interferências políticas nas decisões técnicas; e que devem ser obrigadas a promover uma cultura forte de supervisão objectiva e a fazer divulgação pública das suas actividades.

Transformação e negócios locais

Também podemos aprender com a experiência internacional que os recursos extractivos esgotáveis devem ser vistos como uma oportunidade para estabelecer um novo caminho de crescimento transformador, mas não como o factor determinante desse caminho a longo prazo. As políticas para identificar, promover e desenvolver estratégias para outrasactividades não extractivas — incluindo a agricultura — são uma componente fundamental de uma abordagem estratégica mais abrangente à integração de uma indústria extractiva.

Foto: Martin Kníže
Foto: Martin Kníže

As políticas de conteúdo local, como por exemplo a aquisição local de bens e serviços, e a integração a jusante das indústrias extractivas para promover uma produção mais refinada têm sido tradicionalmente as duas principais componentes dessa abordagem. Há, no entanto, desafios em ambas as áreas destas políticas e, mais uma vez, as experiências de outros países em desenvolvimento oferecem uma lista de questões a serem consideradas e de armadilhas a serem evitadas. Por exemplo, a maior parte da nova actividade de conteúdo local tem de ser encorajada para ser comercialmente viável e vendável, mesmo depois de se terem ido embora há muito tempo os compradores do sector extractivo.

A experiência internacional sugere que Moçambique beneficiaria de promover os seus negócios locais e desenvolver actividades a jusante, esforçando-se de forma abrangente para melhorar o seu ambiente de negócios relativamente pobre e não se concentrando de forma muito restrita em projectos locais de curto prazo com metas de conteúdo local baseadas em medidas obrigatórias. Entre outros, isso significaria lidar com obstáculos como infra-estruturas desadequadas, acesso restrito ao crédito e fragilidades na regulamentação e tributação das empresas.

Finalmente, as questões relacionadas com a mitigação de danos e a entrega de benefícios melhorados às comunidades locais afectadas pela actividade extractiva são uma componente vital da abordagem geral que é necessária. As experiências internacionais dizem-nos que há muitas maneiras positivas de alcançar esse objectivo abrangente, incluindo uma grande variedade de abordagens de parcerias voluntárias, combinadas em alguns casos com uma variedade de possíveis abordagens obrigatórias/legais.

IMPLICAÇÕES

  • As indústrias extractivas podem de facto impulsionar significativamente a economia moçambicana nos próximos anos, mas não devem ser vistas como representando o futuro da economia a longo prazo.
  • É importante enquadrar as políticas para garantir que os gastos privados (directos e indirectos) são uma força efetiva e contribuem como estímulo para a produção não extractiva nova, juntamente com quaisquer programas estatais.
  • Moçambique beneficiaria de promover os negócios locais e de encaminhar ligações, usando como elemento importante da sua abordagem global o ataque de forma abrangente às fragilidades do seu ambiente de negócios relativamente pobre.

Este Policy Brief provém do projecto Crescimento Inclusivo Moçambique—reforçando a investigação e as capacidades e é baseado no Working Paper ‘Extractive industries and development - lessons from the international experience for Mozambique’, de Alan Roe